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sábado, 2 de abril de 2011

O pastiche ou apropriação - uma análise sobre o noir na atualidade - Parte III

Finalmente chegamos ao terceiro e último post onde analisamos a apropriação do gênero Noir como tendência na atualidade.

Vimos os comentários de estudiosos, posições negativas quanto a apropriação, sendo o pastiche uma forma "cega" e "vazia", reduzida a imitação, outras que enxergam como uma renovação e até mesmo uma necessidade da contemporaneidade, devido à condição de estranhamento em relação ao momento vivido, buscando no passado referências que possam explicar ou dar sentido a este que hora participamos e hora nos distanciamos.

Em uma primeira análise, podemos ver no Noir uma forma de filmar que, circulando por diversos estilos, apropriou-se de algumas de suas características atribuindo-lhe uma roupagem nova culminando na associação de elementos do gênero em si.


The Big Combo - 1955

A meu ver, o Noir já transitava pela apropriação e fez surgir um gênero carregado de experimentação da técnica cinematográfica, além de ter a liberdade de exibir uma temática muito próxima do momento vivido - relembrando, as condições sociais nos Estados Unidos diante do Crash da Bolsa e a Segunda Guerra em seguida - e todo o clima sombrio carregado de dúvidas, desconfiança e incerteza eram o reflexo do sentimento que pairava no país e adiante, no mundo.

Já o ressurgimento nos últimos 25 anos do gênero, trazido em parte pelos meios acadêmicos e jornalísticos, surgindo produções que apropriam-se das técnicas e estilo com consequente interesse do público ao ponto deste tornar-se cult nos faz pensar quais fatores levaram a tal redescoberta, e quero crer que não se trata apenas de um bom trabalho da mídia.

Primeiramente, fala-se no interesse pela alta qualidade técnica e fotográfica além do tema realista. Ma não podemos nos esquecer da existência na atualidade da corrupção e insegurança, as dúvidas quanto ao período em que vivemos, em constante e acelerada mudança.


The Maltese Falcon - 1941

A angústia extende-se ainda em relação ao ambiente urbano onde ambição, egoísmo e materialidade predominam, com diferenças sociais e a decadência dos valores morais que geram uma forte insegurança entre o homem e seu meio, outra forte identificação que refere-se a temática do Noir pela semelhança do sentimento e condições do indivíduo desde a origem do estilo. Talvez essa gama de fatores permitam uma comparação em relação à época do surgimento deste gênero cinematográfico.

Pensando no cinema e seu papel como entretenimento, podemos analisar a tendência em algumas produções na atualidade, carregadas de efeitos especiais e nem sempre com conteúdo, além da promoção constante de atores e atrizes como símbolos e referências de estilo. Esses são outros fatores que podem explicar o retorno ao passado e resgate de uma arte de estética refinada, dotada de alta criatividade técnica e temática mais próxima da realidade, livre dos estereótipos que mascaram a condição humana.


Side Street - 1950

O Noir atende ao entretenimento, mas fala do humano e a ameaça que a cidade e outros elementos, como por exemplo a figura feminina, provocam, sem sentimentalismos ou máscaras que encubram suas deficiências, em especial as morais. Com técnica meticulosamente dirigida, mostra o lado sombrio da humanidade, trazendo à luz a verdade.


Out of Past - 1947

Numa sociedade em que a imagem se faz mais importante do que nossa essência, vivendo em um ambiente de concreto frio que parece refletir-se no comportamento humano, no Noir, a máscara extingue-se ao revelar o que se passa no interior das mentes, nos redimindo e nos aproximando da essência humana, buscando refletir sobre a real condição em que vivemos.

Mauro Baptista, doutor em Artes pela USP, diz que o “Noir significou, na época, um revigoramento do cinema americano” e que “os filmes Noir eram um lugar de experimentação numa época onde o cinema americano dominava o mercado mundial”. (Revista Quem Fev/2006). O cinema americano dominante de que ele fala eram os glamourosos e otimistas musicais que buscavam camuflar a situação social vigente.

Quero crer que a apropriação do gênero na atualidade está mais próxima da análise acima, assim como a de Giorgio Agamben, sobre a tendência no contemporâneo de resgatar sentido no passado para entender o momento atual. Penso ainda que o retorno do Noir trouxe um revigoramento e renovação do estilo, tal como acontece em diversos campos como a moda, por exemplo, onde o homem consegue, a partir de referências do passado, trazer à tona a lembrança e uma nova visão a respeito.

Esta é a opinião desta que escreve. Permito que o leitor aproprie-se ou participe desta análise ou discorde totalmente, discutindo a respeito.

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